quinta-feira, 12 de março de 2020

CRISE DE SANTIDADE


Crise de Santidade

Casando-se Com o Sistema!

Eu tinha apenas sete anos de idade quando minha mãe aceitou a Cristo numa denominação pentecostal. Lá se vão quase cinqüenta anos! A exigência de se viver um padrão cristão e a disci­plina rígida a que nos submetemos desde os primeiros dias da Escola Dominical marcaram nossas vidas.  Hoje consigo perceber os resultados no seio da família: Cansada e numa cadeira de rodas, mamãe não consegue dimensionar o rastro de seu testemunho: 1 filho pastor e escritor, uma filha esposa de pastor e pregadora, seis netos no ministério em tempo integral, afora tantos outros fi­lhos, noras, genros, netos e bisnetos comprometidos em suas congregações com o evangelho de Cristo Jesus!
No decorrer dos anos entendi que o mundo olha para a igreja esperando nela ver um dife­rencial, um estilo de vida que contraste com o estilo de vida da sociedade.
O mundo costumava ver a igreja sob a ótica do respeito, de vida transformada, de gente dife­rente, de pessoas de bens - de cujo seio saiam empregados submissos, donde empregadas do­mésticas eram requisitadas, de gente que pagava em dia suas contas - em que o dono do arma­zém vendia fiado na caderneta sabendo que receberia seu dinheiro.  No dizer de Pedro, sem amoldar-se às paixões da vida mundana que tínhamos antes de receber a Cristo (1 Pe 1.14). No dizer de Paulo, viver sem conformar-se com esse mundo (Rm 12.2) mostrando ao mundo “como se deve proceder na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da verdade” (1 Tm 3.15).
Recordo-me que em 1962 quando a igreja pentecostal foi grandemente perseguida em Porto Alegre pelos meios de comunicação contrários à realização de uma campanha evangelística, um cidadão foi para o rádio defender os crentes. Sua defesa: os crentes eram seus melhores funcioná­rios!
No entanto, no decorrer dos anos a igreja incorporou em seu seio os valores mundanos, a filosofia do mundo, seus modismos, deixando-se levar ao sabor do sistema. Confundiu contextuali­zação com contemporização - não soube trabalhar no contexto da sociedade e acomodou-se à sociedade que ela tanto insiste em mudar.
Ainda hoje o mundo espera ver na igreja o diferencial entre aquilo que frustradamente vive e o que espera encontrar na igreja - e quase não o encontra! Os pastores, antes serviçais, em cujas casas os pobres do bairro encontravam lenitivo e alimento, escassearam!
No lugar desses surgiram pastores sonhadores de riquezas, profetas balaônicos de olho nos presentes de Balaque; ricos, abastados, vivendo em condomínios fechados, alienados da própria membrezia, vivendo na opulência e no fausto. Alguns optaram por uma teologia de prosperidade que contrasta com a simplicidade de se viver o evangelho.
Vivem longe de suas paróquias, enquanto no passado o certo era viver entre os paroquia­nos, entre as pessoas do mesmo bairro. O pastor outrora tão presente no lar dos fiéis, são vistos de longe, e na imensidão de seus templos parecem figuras minúsculas gesticulando no púlpito, a menos que sejam projetados no telão ou vistos na tela da tevê.  A nova geração de crentes - cujos avós eram tão pobres, mas fiéis - melhorou de vida, subiu socialmente para a classe média e, até mesmo alguns ricos despontaram no cenário evangélico. Membros de igrejas, antes considerados proletariados, prosperaram, e hoje fazem parte da nata industrial e comercial da nação, no entanto, muitos deles se esqueceram dos exigentes padrões bíblicos: tratam seus funcionários da mesma maneira - quando não pior - que os patrões mundanos.
Aliás, alguns empresários que não se confessam cristãos têm ótima reputação dos seus fun­cionários; por outro lado, alguns crentes sequer querem trabalhar para empregadores evangélicos. Da mesma forma, os empregados evangélicos perderam o respeito e já não se submetem aos pa­trões como é ensinado no Novo Testamento. Costumam ser piores do que os descrentes.
Para encobrir o que somos, criamos a moda gospel, buscando parecer que o estilo de vida cristã, sua música e mensagem tenham adquirido nova roupagem. Pelo menos existe o charme glamouroso (desculpe-me o pleonasmo) na substituição do termo em português pelo inglês! E a geração gospel vai para a televisão falar de Cristo e do novo nascimento, literalmente sem roupa­gem alguma!
Mulheres sensuais e seminuas com um palavreado profano - não que queiramos que todos aprendam o evangeliquês - afirmam ser membros dessa ou daquela igreja. Não apenas as mulhe­res, mas também os homens confundem pelo visual e palavreado a mensagem do evangelho!
Apesar da obscenidade e do mundanismo que repugna o mais vil pecador, seus pastores sorriem e caladamente consentem, afinal o nome de sua igreja e seus nomes podem ser ouvidos pela mídia nacional. Outros, vestindo a roupagem tradicional dos evangélicos, sugam dos pobres o dinheiro e os bens em troca de um compromisso com Deus!
Além destes, surgiram pastores, pregadores e cantores, em todas as denominações, que mesmo sem aquela extravagante aparência, sem as requebradas coreografias e palavreado mun­dano - mantendo a antiga forma de vestir e o visual tradicional dos crentes - mas que em nada diferem em seu comportamento e moral daqueles que não conhecem a Jesus, nem por ele foram transformados, agregam-se à classe vil protagonizada por Jezabel e Balaão.
Seus cachês são os mais altos e seu comportamento, pior! São pessoas que, mesmo man­tendo a postura evangelical, a aparência tradicional, repito, encaixam-se perfeitamente no perfil traçado por Pedro e Judas (2 Pe 2.10-22 e Jd 8-16).
A opção de ser crente, de ser um fiel discípulo de Jesus - às vezes uma decisão difícil sa­bendo-se que há um preço a ser pago em seguir a Jesus - já não é levado em conta por boa parte dos que se dizem cristãos, por pessoas que dão péssimo testemunho, pois seu comportamento no campo de sua atividade profissional contradiz seu palavreado e suas afirmações de fé. E isso vai do carpinteiro ao artista, da empregada doméstica ao famoso atleta, do estudante ao político.
Algumas igrejas parecem ter perdido o rumo. A quantidade de divórcios entre seus membros é testemunha gritante de como o evangelho diluiu-se no meio de uma sociedade paganizada. A santidade de alguns jovens que se propõem viver castos até o casamento é motivo de chacota no seio da própria congregação.
À essas igrejas, aos seus pastores, cantores, líderes e políticos cristãos, o profeta ergue a voz em protesto!
A mensagem de Amós precisa ecoar novamente na igreja, pois tem uma palavra de alerta aos membros da comunidade da fé. Ele não apenas diria “afasta de mim o estrépito dos teus cânti­cos; porque não ouvirei as melodias da tua lira” (Am 5.23), acrescentaria:
“Afaste de mim o palavreado das mensagens que você prega, pois fecho os ouvidos quando você sobe no púlpito; cerro os olhos para não ler o que você escreve; detesto quando você men­ciona o meu nome; sua música é muito linda, sua banda é perfeita, sua voz belíssima, mas o som de sua melodia chega aos meus ouvidos desafinado pelo estilo de vida perverso que você tem; o cheiro que você exala provoca-me náuseas...”.
Amós clama pelas ruas:
“Vocês oprimem o pobre e o forçam a dar-lhes trigo” - (Am 4.11), isto é, sugam dos pobres todo o dinheiro que eles têm para satisfazer os desejos pessoais de vocês, para construir suntuo­sas catedrais e comprar aptos. e terras. “Vocês oprimem o justo, recebem suborno e impedem que se faça justiça ao pobre nos tribunais” (4.12b), isto é, vocês os mantêm sob o jugo da autoridade, ameaçando-os e intimidando-os com a possibilidade de exclusão pública do rol de membros. A opressão da vara do pastor, de todas, é a pior!
Amós clama na igreja:
“Vocês se deitam em camas de marfim e se espreguiçam em seus sofás” (6.4), enquanto os pobres da igreja dão duro e trabalham; enquanto seus obreiros andam em ônibus lotados, à pé, suando para fazer a obra de Deus, vocês como líderes, do alto de sua autoridade, descansam no sofá repassando um a um as centenas de canais de tevê, deleitando-se em viagens, dormindo nos mais caros hotéis e freqüentando os shoppings da moda.  Ele diz aos cantores e grupos que co­bram altos cachês para se apresentarem nas igrejas:
Vocês “dedilham suas liras como Davi e improvisam em instrumentos musicais” (Am 6.5), mas não têm o coração de Davi; buscam, isso sim, seu próprio bem-estar e, depois de cantarem e louvarem nos cultos das igrejas ou nos festivais, fecham atrás de si as portas do quarto de hotel e deleitam-se na fartura da melhor comida e das bebidas mais caras, quando não em orgias sexuais!
“Vocês bebem vinho em grandes taças - não apenas vinho mas toda sorte de bebidas caras e finas nas festas de gente ímpia que detesta o nome de Cristo - e se ungem com os mais finos óleos - têm aparência de possuir grande unção e poder, confundem poder e unção com habilidade e profissionalismo; fazem do ministério seu ganha-pão - mas não se entristecem com a ruína de José - isto é, vocês não choram, nem clamam, nem jejuam, nem se importam com a ruína da igreja e do mundo! Pensam apenas em vocês mesmos! (Am 6.6).
A bússola da verdade deve urgentemente ser consultada para que a igreja ande na rota tra­çada por Deus! Quando isso acontecer, o mundo voltará a olhar a igreja como uma sociedade sé­ria, diferenciada; como sociedade que tem rumo próprio.
Políticos evangélicos, firmem-se na verdade, pois o mesmo Deus que vocês alegam que servem, haverá de sacudir os fundamentos da estrutura política, como tantas vezes o fez, ex­pondo-lhes à ignomínia. A mídia que vocês tanto amam é laço que lhes prenderá os pés; mordaça que lhes impedirá de falar; espinho que lhes cegará os olhos - essa mesma mídia impedir-lhes-á a caminhada, mas por certo, se vocês tiverem temor de Deus, haverão de se firmar no Senhor, ser­vindo-lhe e apenas a ele de todo o seu coração!  “Ouçam esta palavra, vocês (...) que estão no monte de Samaria - Os políticos. 

Vocês que estão em posição de autoridade, nas casas do povo - vocês que oprimem os pobres e esmagam os necessitados - cujos altos salários contrastam com o pobre salário mínimo, e com o baixo reajuste salarial dos velhos e velhas aposentados, vocês que dizem - tragam bebidas e vemos beber - isto é, que vivem em festas, no meio da fartura (Am 4.1).  Ganham altos salários para fazer pequenos discursos nas Assembléias e Câmaras do povo. Até quando suportará Deus o hálito das festas e da embriagues?
As eleições estão chegando e teremos que suportá-los novamente bafejando o odor do mundo de Maquiavel sobre os púlpitos de nossas igrejas! Será insuportável, uma vez mais, obser­var pastores, cantores e líderes seguindo o curso do mundo governado pelo diabo - seguindo a carreira do mundo!  Que Deus tenha misericórdia de nós e abra-nos os olhos para enxergarmos na sua bússola o Norte a seguir. Que a igreja volte a andar no caminho da santidade e se diferencie do mundo ao seu redor!

   


João A. de Souza Filho

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