Uso e costumes.
No
Afeganistão, por motivos religiosos, o homem é obrigado a usar barba e a mulher
é obrigada a cobrir totalmente o corpo. Para que elas enxerguem, é permitido o
uso de uma tela reticulada e quadrada em torno dos olhos. A lei é válida para
todos os afegãos em todo o país, desde a chegada dos talibãs ao governo. A
polícia moral talisbã tem ordem de prender homens cujas barbas estejam muito
curtas e mulheres cujos rostos não estejam cobertos. Os homens ficam na prisão
até que a barba cresça novamente.
Em certa
denominação protestante brasileira os varões não devem andar de shorts,
bermudas nem sem camisas. E as mulheres precisam ter cabelos crescidos, não
trançados nem encrespados artificialmente. Não são permitidos cortes para
reduzir o volume do cabelo nem franjinhas.
Essas
informações tornam o livro É proibido, de Ricardo Gondim, muito atual.
Publicado pela Editora Mundo Cristão em dezembro do ano passado, o livro de 183
páginas tem como subtítulo O que a Bíblia permite e a igreja proíbe.
Apesar de
polêmico e de ter de enfrentar muitas e sólidas barreiras, a obra de Ricardo
Gondim, pastor da Igreja Evangélica Assembléia de Deus Betesda, em São Paulo,
não pretende ofender, contender ou zombar de qualquer postura denominacional.
"Meu intento", explica o conhecido pregador e escritor, "é
ajudar aquelas pessoas que carregam um enorme ponto de interrogação sobre qual
procedimento bíblico deve ser adotado quando se vestem, se maquilam, cortam
cabelo, usam calças compridas, se divertem e lêem" (p. 18). Gondim repudia
o legalismo religioso sem abrir as portas da igreja ao conceito libertino da
vida cristã.
É proibido vai
embelezar muitas mulheres e tirar a gravata e o paletó de muitos homens, sem
prejudicar a beleza interior, que pode até aumentar, se se der mais importância
à verdadeira piedade cristã do que à mera aparência. É proibido vai diminuir o
número de evasões das igrejas evangélicas mais legalistas e vai tornar a
caminhada cristã mais alegre e menos opressora e artificial.
Mas é preciso
ficar bem claro: o novo livro de Ricardo Gondim não pretende alargar a porta
que Jesus chamou de estreita nem o caminho que Ele chamou de apertado (Mt
7.13-14).
Fonte:
Ultimato
O pastor da Assembléia de Deus Betesda lança livro em que
questiona a ditadura dos costumes
Não é somente
por causa de sua pregação magnética e ungida que o pastor Ricardo Gondim é
freqüentemente solicitado a dirigir cultos, vários deles diante de grandes
platéias, e ministrar palestras em congressos e seminários. O líder da Assembléia
de Deus Betesda, em São Paulo, também é reconhecido em todo o país por um
equilíbrio teológico que o distingue de parte significativa dos colegas de
ministério. É pentecostal, mas tem horror ao legalismo. Possui formação
teológica à altura dos maiores intelectuais das igrejas históricas, mas
discerne nos movimentos carismáticos maior capacidade de adaptar-se aos
contornos culturais. Defende uma igreja de princípios sólidos, mas não receia a
comunicação com a sociedade.
Por estes e
outros motivos, cada livro que escreve é garantia de sucesso. O mais novo, É
proibido, não foge à regra.regra. Lançada pela editora Mundo Cristão em
dezembro do ano passado, a obra já está na terceira edição. Nela, Gondim traz
para discussão o arbítrio eclesiástico ou, numa linguagem mais simples, a
ditadura pastoral em questões relativas à conduta do crente, como a proibição
do uso de calças compridas pelas mulheres, de ir ao cinema ou à praia, de
assistir à televisão ou mesmo de bater palmas durante o culto. Com a autoridade
de quem dedicou-se durante muitos anos à observação e à pesquisa dos movimentos
espirituais, sociais e políticos (no sentido mais amplo do termo) da Igreja
Evangélica brasileira, o pastor Ricardo Gondim falou, em entrevista a VINDE,
sobre o pentecostalismo crescente no país, os riscos do legalismo, a ascensão
de lideranças quase ditatoriais e a necessidade de questionamentos para que
ocorra o verdadeiro crescimento espiritual.
Como o senhor vê o movimento pentecostal no Brasil?
Eu diria que o
pentecostalismo tem duas frentes: o pentecostalismo clássico e o chamado
neopentecostalismo. Este último tende a ser mais identificado com o que se
denomina movimento carismático. O movimento pentecostal clássico é aquele
encabeçado pela Assembléia de Deus.
Por que o movimento neopentecostal tem crescido tanto nos
últimos anos?
O movimento
carismático tem uma agressividade muito grande na mídia. Portanto, tem maior
facilidade de adaptar-se aos anseios culturais e falar muito mais próximo da
cultura que aí está. Não há nenhum demérito nisto, é apenas uma característica.
Existem, sim, perigos potenciais nesse diálogo. Há o perigo da conformação como
o presente século. Além disso, corre-se o risco de a cultura acabar
influenciando mais a igreja do que ela consegue influenciar a cultura.
Como o senhor analisa o relacionamento entre os crentes
chamados históricos e os pentecostais no Brasil?
Este
relacionamento está cada vez mais amigável. As fronteiras entre históricos e
pentecostais estão sendo alargadas, e a tendência é que haja cada vez menos
tensões entre os dois segmentos. Tenho visto que o trânsito entre pastores
pentecostais e tradicionais tem sido facilitado. A cada dia, os rótulos
denominacionais têm sido menos respeitados, e, neste sentido, esta é uma
tendência muito positiva. Aliás, as diferenças entre as liturgias pentecostal e
histórica têm sido quase imperceptíveis. Nós estamos muito mais próximos de uma
liturgia brasileira, diferente da americana ou da européia.
O senhor diria
que a expansão do pentecostalismo é um caminho sem retorno, que vai acabar
atingindo as chamadas igrejas tradicionais, ou existe a possibilidade de, num
determinado tempo, ele se desacelerar?
Eu acredito
que a tendência pentecostalizante da Igreja Evangélica brasileira é
irreversível. As igrejas tradicionais, conhecidas como denominações históricas,
de alguma maneira já têm sido influenciadas por esse avanço fortíssimo do
movimento pentecostal. Esta influência é muito mais sentida na liturgia, embora
na própria parte teológica e doutrinária das igrejas tradicionais esteja
havendo também uma forte influência. Não há hoje, eu diria, nenhuma igreja, por
mais que se diga conservadora, histórica ou denominacional, que não tenha
dentro do seu círculo pessoas com forte tendência pentecostal.
Qual seria o impacto disso no comportamento dos crentes?
A Igreja tem
passado por uma verdadeira revolução litúrgica nos últimos 30 anos. E essa
revolução é predominantemente de influência pentecostal, carismática. Eu acho
que houve também, embora com menos força e velocidade, uma mudança teológica,
haja visto a dificuldade que a Igreja brasileira teve, nestes últimos dez anos,
de trabalhar questões como a teologia da prosperidade e a teologia da guerra
espiritual, que foram trazidas no bojo do movimento neopentecostal e forçaram
as igrejas denominacionais e as pentecostais clássicas a reelaborarem a sua
teologia com respeito a anjos, a demônios, a dons espirituais. Hoje, a Igreja
Evangélica do Terceiro Mundo, não só no Brasil, como na África e na Ásia, tem fortes
tendências pentecostais, sem respeitar, por assim dizer, o rótulo
denominacional da porta da igreja.
Até que ponto, nesta nova situação, o conservadorismo foi
deixado de lado?
Embora muitos
avanços tenham acontecido, a Igreja Evangélica ainda é um bastião de
conservadorismo, de falta de diálogo cultural. O movimento pentecostal
brasileiro, e o evangélico de um modo geral, tem muita dificuldade em enxergar
a graça comum, a graça de Deus distribuída a todos os homens, e que os capacita
a fazer coisas boas - embora seja participante da natureza caída. Nós temos a
tendência de rotular pessoas, costumes e certas práticas, e de nos isolarmos do
diálogo. Ainda hoje, o evangélico brasileiro típico é conhecido como aquele que
pode ou que não pode fazer certas coisas.
O senhor acaba
de lançar o livro É proibido, em que questiona o legalismo. A Igreja brasileira
ainda sofre com uma espécie de ditadura de costumes?
Com certeza.
Nós ainda temos uma ditadura dos costumes, que vai desde ornamentos, desde a
indumentária, principalmente a feminina, até o diálogo cultural com as artes,
com a música, por exemplo. Nós ainda temos a famosa frase: "Evangélico não
ouve música do mundo", como se houvesse este tipo de departamentalização
nas Escrituras entre aquilo que pode ou não ser consumido por nós só porque foi
produzido por uma pessoa que não é evangélica. Eu já tive o desprazer de saber
que algumas igrejas evangélicas ainda proíbem instrumentos musicais como a
bateria, e outras que proíbem o ato de bater palmas.
Mas isso não acontece somente no interior?
Não, acontece
mesmo em capitais. Aqui em São Paulo fui convidado para fazer uma cerimônia
religiosa em determinada igreja, e foi-me dito que era proibido ter música que
não utilizasse instrumentos típicos da Reforma e da liturgia reformada. Era
proibido utilizar certos ritmos etc. Então a expressão "é proibido"
ainda é muito utilizada, literalmente. É completamente anacrônico, mas coisas
assim existem aqui em São Paulo.
O que está por trás disso? Uma concepção legalista?
Sim. Essa
concepção advém da nossa incapacidade de ler a Bíblia como um livro cultural. A
Bíblia não é um código de doutrinas, não é um catecismo que foi codificado para
que nós a obedecêssemos como um regulamento religioso. A Bíblia é a história da
interação de Deus com a cultura humana. No meu livro É proibido fiz um esforço
para mostrar às pessoas que a Bíblia não é uma dogmatização teológica, mas uma
saga humana onde existem coisas bonitas e feias. Enfim, assim é a vida como um
todo.
O nosso comportamento
como cristãos não deve ser o de fazer um catálogo do que pode e o que não pode,
mas conviver com essa cultura e, no exercício da nossa maturidade, fazer aquilo
que Paulo nos ensina: examinar tudo e reter o que é bom. O que eu quero mostrar
no livro é que nós podemos olhar para a nossa cultura, para a convivência
humana, e ver que existem lampejos, réstias da grandeza de Deus na produção
humana. Como cristãos, devemos resgatar isso e ver ali sinais da graça comum de
Deus para todos.
Por outro lado, o legalismo não tem o mérito de impedir que
a Igreja se vulgarize?
Eu respondo
com a Palavra de Deus. O apóstolo Paulo disse que o legalismo não tem valor
nenhum contra a sensualidade. Este esforço de acrescentar à graça de Deus a lei
é fortemente repelido nos escritos paulinos, principalmente nas epístolas aos
Gálatas e aos Colossenses. O legalismo não produz santidade nem amadurecimento.
O máximo que ele produz são pessoas que obedecem cegamente, mas que não estão
convencidas da verdade. E, voltando à sua pergunta, o legalismo impede
grandemente o avanço da Igreja. E por quê? Porque, embora crie comunidades de
pessoas obedientes, separa grandes segmentos pensantes da sociedade. Resultado:
o Evangelho acaba ganhando em obediência, mas perdendo em reflexão. A Bíblia
não quer uma obediência cega, mas uma obediência lúcida. Por isso, Deus disse:
"Vinde, e arrazoemos." É o que Paulo chamou de culto racional.
O senhor acha que o legalismo atrapalha a evangelização?
Sim, porque
nós crescemos em segmentos menos reflexivos da sociedade e nos afastamos dos
setores pensantes, dos formadores de opinião. Nós jamais conseguiremos mudar o
Brasil se não ganharmos os formadores de opinião, que têm uma reflexão e uma
análise crítica. A minha questão é que, no Brasil, nós estamos crescendo a
passos largos, principalmente em grandes centros como o Rio de Janeiro e São
Paulo, mas ainda nos mostramos incapazes de dialogar com aqueles que estão nos
segmentos mais pensantes da sociedade. Você pode ganhar uma pessoa pela imposição
dogmática do medo, mas perde aqueles que têm a capacidade de refletir
criticamente. O Evangelho alcançou o mundo porque conseguiu vencer a
resistência pensante dos romanos, e assim chegou à Europa, ao Ocidente.
Foi por isso
que o apóstolo Paulo teve tanto interesse em ir a Antioquia, que era uma cidade
universitária, à Grécia, que tinha sido o berço do saber na Antigüidade, e a
Roma, a imperatriz do mundo, porque ele sabia que, ganhando os romanos, estaria
ganhando o mundo.
Na sua opinião, por que têm surgido tantas lideranças
absolutistas no meio evangélico?
Politicamente,
a América Latina tem um histórico de caudilhismo, e esta infeliz vocação
proporciona ao meio evangélico um solo fértil para que essa mentalidade se
desenvolva na igreja. Um certo líder pentecostal gostava de dizer que, quanto
mais ele surrava os seus membros, mais obedientes e fiéis eles ficavam. Eu
creio que essa cultura brasileira ajuda a provocar isso. Eu diria também que
nós, no mundo evangélico, crescemos durante muitos anos sem uma leitura
interdisciplinar. Nós fomos ensinados a ler somente a Bíblia. No máximo, o que
se permitia era a leitura de livros que falassem de assuntos diretamente
ligados a ela. Esta falta de conhecimento do mundo, de horizontes mais largos,
favorece a mentalidade de gueto, da obediência cega e irrestrita ao líder. As
pessoas começam a acreditar naquela tese de que a verdade se restringe àquilo
que lhes é ensinado pela igreja-mãe. Elas ficam com medo de se aventurar além
dos horizontes que lhes são fornecidos. Tudo o que for além desses contornos é
apresentado como falso e perigoso.
O que a Igreja precisa fazer para manter uma atitude ética e
comprometida com valores bíblicos claros sem precisar deste determinismo
legalista?
Eu diria que a
Igreja precisa entender que, por trás da lei, existem princípios que a Bíblia
chama de espírito da lei. É preciso entender que Jesus fez uma clara distinção
entre a letra da lei e o espírito da lei. A letra mata, não produz vida. A
letra da lei é circunstancial, é geograficamente local, mas os princípios são
eternos, para todos. A Bíblia não deve ser vista como um livro de letras secas,
áridas, mas um livro de princípios eternos. É nesses princípios que devemos
buscar os fundamentos que vão alicerçar nossa vida espiritual. É um caminho
mais longo, mas é muito mais frutífero. A lei diz: "Não matarás." O
simples fato de eu não pegar uma arma e matar alguém já me satisfaz com a lei.
Mas o princípio do que Jesus disse sobre não matar é muito mais amplo do que o que
está escrito ali, e vai ajudar-me a não odiar ninguém, nem destruir com a
língua ou com sentimentos amargos outra pessoa que esteja comigo.
Falando em termos práticos, o que o crente deve levar em
consideração na hora de escolher o que lhe convém ou não fazer?
No livro, eu
digo que o que vai determinar o que convém não é só a consciência do cristão,
mas a cultura na qual ele está inserido. Para um índio do interior da Amazônia,
a nudez pode ser coberta apenas por uma tanga. Neste caso, o que convém são os
parâmetros culturais nos quais o indivíduo está inserido. Os mesmos princípios
se aplicam a nós. O que convém e o que não convém não pode ser legislado de
maneira alguma, e sim compreendido de acordo com os ditames culturais nos quais
estamos inseridos. Muitas vezes temos a tendência de legislar sobre a nossa
roupa apenas sob o aspecto da sensualidade. Há outros padrões que devem
delinear nosso comportamento.
Muitas coisas
consideradas extremamente pecaminosas dentro de determinada cultura podem
deixar de sê-lo em outro contexto cultural. Na virada do século, por exemplo, a
mulher mostrar o tornozelo era considerado extremamente sensual. Houve uma
evolução cultural e hoje não é mais assim. O cristão deve entender a sua
cultura, principalmente no caso dos missionários, que não devem tentar impingir
os seus valores culturais.
Igrejas que agem de maneira discricionária, proibindo os
membros de fazer determinadas coisas, ou de usar certas roupas, têm futuro?
A tendência é
que tais igrejas mais e mais isolem-se em pequenos guetos. Perdem a pertinência
cultural e, portanto, têm cada vez menos espaço para falar à sua geração.
Por que algumas igrejas neopentecostais são tão radicais
quanto aos usos e costumes e outras, que seguem a mesma linha carismática, são
extremamente liberais nessa questão?
Eu diria que
as igrejas neopentecostais em geral surgiram através de novos líderes, e não
têm muita continuidade. Essas lideranças não têm muito lastro, nem compromisso
institucional. São pessoas que começam a partir de suas próprias visões,
sonhos, têm muito ímpeto evangelístico e uma grande determinação de alcançar
sua cidade, seu país. Como essas pessoas não têm muitos elos institucionais,
são mais livres para traçar os próprios contornos.
Muitas dessas igrejas adotam teologias e eclesiologias de
fundamento bíblico questionável, como a teologia da prosperidade. Qual o perigo
disto?
As igrejas
neopentecostais têm sido fortemente influenciadas por uma teologia americana, a
teologia de confissão positiva, que reflete a preocupação com a ascensão
social, onde acredita-se que as pessoas, ao abraçarem o Evangelho,
necessariamente ascenderão socialmente. Mas não através do trabalho, da
frugalidade, da poupança, como diz a sociologia de [Max] Weber, e sim da
mágica, da oração forte, da bênção sobre a carteira. Esta teologia da ascensão
social rápida chegou no Brasil há uns 25 anos, e foi fortemente aceita devido à
nossa estrutura sócio-econômica de privilégios. Aqui, ou a pessoa já nasce rica
ou a sorte a aquinhoa de maneira especial. Num país com índices alarmantes de
pobreza e desemprego, é difícil ascender através do trabalho, do próprio
esforço. Então, foi adequada uma nova linguagem à igreja: basta uma oração para
ser próspero, pode-se reivindicar de Deus a bênção sobre a sua vida. Esta
teologia que visa o bem-estar do ser humano, e não a glória de Deus, não tem
nada a ver com o Evangelho. O Evangelho não tem esta relação direta de bênção
de Deus com prosperidade. Isto é totalmente pernicioso.
Então o movimento neopentecostal seria o responsável pela
disseminação da teologia da prosperidade por aqui?
O movimento
neopentecostal não é propriamente o vilão dessa história. Ele é muito mais
vítima, já que ele foi influenciado por essa teologia. O neopentecostalismo
estava justamente querendo alcançar um segmento, a classe média, que tem grande
ambição de ascensão social. Nos EUA, por ser um país que possibilita a
mobilidade social, essa teologia tem uma plausibilidade muito grande. É por
isso que minha tese sempre foi a de que a teologia da prosperidade teria as
pernas muito curtas na América Latina porque logo esses grandes evangelistas
seriam confrontados com a dura realidade de que aqui as coisas não são bem
assim.
Voltando à questão das lideranças absolutistas, o senhor acredita
numa cartelização das igrejas?
Acho que não
usaria este termo, mas penso que uma das grandes ameaças para a Igreja
Evangélica é o mercado. É o perigo de enxergarmos a nossa missão sob o ponto de
vista mercadológico, através de lentes empresariais. Este é o grande perigo da
Igreja nesta virada de século. Se usarmos a lei da oferta e da procura, vamos
comprometer seriamente a nossa mensagem, adequá-la ao meio e cair no engodo da
mídia, em que o meio se torna mais importante do que a mensagem. O que está
acontecendo nas igrejas é que nós estamos segmentando o mercado. Um pastor
passa a ver no outro um concorrente, e não um cooperador na obra de Deus.
Começa a haver uma grande transferência de membros de uma igreja para outra, já
que as pessoas não têm mais fidelidade à marca, à instituição. Aliás, esta é
uma característica da própria modernidade. Aí, os pastores ficam em busca de
técnicas que mantenham o seu auditório, o seu nicho de mercado.
A Igreja precisa de polêmicas e questionamentos para evoluir?
É lógico. A
Igreja sempre conviveu com a tensão, desde o grupo interno dos apóstolos.
Depois, foi a igreja primitiva, com as questões judaizantes. Mais tarde,
tivemos a teologia agostiniana, a Reforma, o calvinismo, o arminianismo...
Querer esvaziar a Igreja de suas tensões internas é um desserviço que prestamos
contra nós mesmos. Precisamos de contestações internas, precisamos nos reformar
sempre. É aí que crescemos de verdade. Em última análise, nenhum de nós é o
dono da verdade, ninguém tem a última palavra. É através das tensões que vamos
crescer no conhecimento da Palavra de Deus.
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